Case #53 - Beber demasiado, ou dar demasiado?


Tom bebia, demasiado, demasaidas vezes. Tinha-o feito por muitos anos. Às vezes deixava a bebida, às vezes recomeçava. Abby não era feliz, e tinha-se tornado cada vez mais peremptória a respeito das coisas terem que mudar. O problema era que não mudavam - ele deixava de beber, voltavam a dar-se bem por uns tempos, e então de algum modo, tudo voltaria a recomeçar. Abby queria uma boa relação. Queria conexão, comunicação, honestidade. Tinham estado juntos por muito tempo, e ela não queria deitar a relação a perder. Ralhar permanentemente não resultava, mas também não funcionava deixar as coisas seguirem o padrão habitual. Abby estava muito frustrada. Tom não parecia capaz de manter as mudanças que ela realmente necessitava. Ela tinha-se tornado cada vez mais frustrada e desanimada. Não havia dúvidas, Tom tinha um problema com o álcool. Era claro que ele não tinha realmente controlo sobre a bebida, e era também claro que os seus esforços para parar só resultavam por um período de tempo limitado - por vezes 6 meses, mas depois ele retomava. Abby parecia estar a fazer udo o que podia. Tornou a sua posição clara. Demarcou limites. Acudiu a terapia em busca de ajuda. Do ponto de vista da Teoria de Campo, a adicção não é algo ´na´ pessoa, mas algo ´na´família ou relação. É mantida por mais de uma pessoa, apesar de neste caso parecer que Abby estava a fazer tudo o que podia para mudar a situação. A sua participação não era clara para ela - ela parecia não querer nada mais que uma relação livre da adicção. Abby tinha um pai que era controlador, desanimador e com frequência maldoso. As suas necessidades de sustento, de ser escutada não foram supridas. De tal modo que ela aprendeu a ser uma rapariga prestativa, numa tentativa de obter algum tipo de reconhecimento. Isto é aquilo a que chamamos em Gestalt um ´ajuste criativo´. Fez sentido nesse então, mas agora, como adulta, Abby estava descobrir que se sentia cada vez mais bloqueada - o ajuste criativo já não estava a funcionar em seu proveito. Ela identificou que era isto que a tinha levado a ser enfermeira - tomar conta dos outros e das suas necessidades. E era isto que estava a fazer com Tom. À medida que fomos explorando este tema, Abby deu-se conta que a sua prestatividade continha em si uma espécie de reciprocidade. Se ela desse aos outros, homens, então ela seria útil, desejada, reconhecida, necessária. E era exactamente esta a situação com Tom. Ele precisava dela, e ficava muito triste se ela se zangasse e se retirasse. Ela não conseguia vê-lo tão triste, e então voltava a aproximar-se. O ponto chave foi quando identificámos como a sua prestatividade era também uma espécie de manipulação: ´se eu te aportar algo, então vais precisar de mim, e não me abandonarás´. O que foi importante foi a mudança de perspectiva - agora Abby era capaz de ver mais claramente não apenas o comprtamento adictivo de Tom, mas também a sua própria manipulação repetitiva - dar para receber, ou como chamamos em Gestalt, ´proflexão´. Este é um exemplo daquilo a que damos o termo ´fronteira distorcida´ - parece que algo está a ser dado, mas na realidade existe um motivo subjacente, pelo que o aspecto da dádiva é condicional, não incondicional. Este reconhecimento foi dramático para ela - ela pôde reconhecer não apenas o padrão familiar de Tom com a bebida, mas um outro padrão de mãos dadas com esse - o da sua forma manipuladora de dar. Em Gestalt trabalhamos com tomada de consciência, mas tal não é apenas limitado ao ´aqui e agora´, também inclui a tomada de consciência do nosso Campo, com todas as suas camadas complexas, e especialmente os nossos padrões de comportamento escondidos. Trazê-los à luz cria a possibilidade de se apropriar desse comportamento - quaisquer que sejam os seus antecedentes - e assim ´assumir a responsabilidade´ numa terminologia Gestalt. Tal é libertador. Vermos a nossa própria manipulação dá-nos opções, enquanto que ver somente o comportamento bloqueado/adictivo da outra pessoa nos deixa apenas com a reacção.

 Posted by  Steve Vinay Gunther